sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Raymond Franz Fala de Sua Exclusão das TJ.

A exclusão de Raymond Franz, da sociedade religiosa Torre de Vigia, a que pertenceu por quase toda a vida, foi comparada a uma excomunhão do Colégio de Cardeais da Igreja Católica, em artigo de página inteira do semanário internacional Time (22 de fevereiro de 1982). Ele havia ocupado privilegiada posição, por nove anos, como um dos 17 membros do exclusivo “Corpo Governante” dessa entidade, até demitir-se do cargo, sendo mais tarde desligado da religião. Dita organização, com sede em Brooklyn, N.Y., EUA, comanda as atividades mundiais das “Testemunhas de Jeová”.

Nesta entrevista exclusiva ao repórter Azenilto Brito, de Correio Cristão, Raymond Franz indica algumas das razões que o levaram a não só retirar-se da liderança daquela sociedade, que alega ser “teocrática”, mas produzir dois livros em que oferece provas irrefutáveis dos erros e da equivocada metodologia das “testemunhas de Jeová”, ao ensinarem a Bíblia.

Entre outras importantes atribuições que Raymond Franz ocupou no seio da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, destaca-se o seu papel de membro da comissão executiva da organização, ou o seu “Corpo Governante”— na época, composto de 17 membros, rigorosa e cuidadosamente selecionados. Ele é sobrinho de Frederick Franz, presidente mundial e principal “teólogo” dentre as “testemunhas de Jeová” até seu falecimento em dezembro de 1992 e foi encarregado de coordenar parte do material para o livro Aid to Bible Understanding [atualmente chamado Insight on the Scriptures em inglês, e Estudo Perspicaz das Escrituras, em português], tipo de encicoplédia bíblica que se tornou a obra mais erudita produzida pelas enormes gráficas daquela sociedade religiosa. Ele foi responsável pela pesquisa do verbete mais longo do livro, que trata sobre “Cronologia”.

Na pequena comunidade de Winston, a cerca de 45 km a noroeste de Atlanta, estado da Georgia, EUA, ao longo da rodovia que conduz à divisa com o Alabama, foi onde contatamos esse ex-líder entre os jeovaístas, numa fria noite de março de 1993. Eu fizera arranjos com ele por telefone para uma entrevista. A princípio ele demonstrou hesitação em ter uma entrevista gravada: não quer que as “testemunhas de Jeová” interpretem suas declarações como uma adesão a ensinos de outras igrejas. Após deixar a seita, ele decidiu não se ligar formalmente a qualquer igreja, em particular, mas participa com freqüência de estudos bíblicos com outras ex-“testemunhas”. Sendo que não fez objeções a tomarmos notas, por escrito, de suas declarações, chegamos a um consenso para a entrevista.

Raymond Franz fora um dedicado membro da seita das “testemunhas de Jeová” por mais de 40 anos e um dos seus 144.000 “ungidos” (os únicos a irem para o céu para viver para sempre com Jesus, enquanto os demais — da “grande multidão” — ficam sobre a terra renovada, numa espécie de “salvação de segunda”, conforme os ensinos da Torre de Vigia). Ele, inclusive, atuou como missionário, enfrentando pobreza, doença e perseguição, ao trabalhar na República Dominicana e em outros países latino-americanos.

Entre vários idiomas que fala, fluentemente, o seu espanhol, é impecável.

Quando na sede internacional da Sociedade Torre de Vigia circularam rumores de que ele discordava de alguns pontos básicos da religião, chegou a ser tratado de modo quase brutal por membros do Corpo Governante, recorda ele, em atitudes desconcertantes de investigações secretas, gravações não autorizadas de conversas telefônicas, insinuações malévolas por publicações da seita e várias outras formas de pressão psicológica, vendo-se forçado a renunciar à sua posição.

Mas o ostracismo a que foi lançado permitiu-lhe mais tempo para refletir sobre o sentido de tudo pelo que havia passado, não só nos últimos tempos, como por toda a sua existência como ativo membro do que o artigo de Time chama de “uma seita apocalíptica”, que reivindica ser o exclusivo canal da verdade de Deus sobre a Terra.

Em sua nova condição de ex-líder religioso e “renegado” da fé, Franz escreveu dois livros, somando mais de 1.000 páginas de material onde detalha o funcionamento um tanto quanto secreto do Corpo Governante e de outros setores da sua antiga religião. A primeira obra se intitula "Crise de Consciência" e foi lançada no Brasil pela Editora Hagnos.

Quem espera encontrar expressões de amargura e denúncias sensacionais em suas obras se desapontará. Franz não trata os que lidaram com ele, na mesma medida em que foi tratado. Antes, procura ressaltar os aspectos positivos daqueles homens, como pessoas sinceras e dedicadas e atribui o comportamento descaridoso e nada diplomático deles a seu respeito às exigências do sistema a que dedicam inabalável fidelidade, bem como à insegurança que tal sistema propicia, com suas freqüentes mudanças de interpretação doutrinária, sobretudo acerca das “datas marcadas” (predições “bíblicas”) de acontecimentos que nunca se materializaram: 1914, 1915, 1918, 1920, 1925, 1941, 1975, entre outras.

Explica Franz, que sua pesquisa para o preparo do livro Aid foi o fator inicial para abrir-lhe a mente para problemas sérios na exegese e na cronologia “bíblica” das TJ.
Entre os pontos sensíveis levantados na pesquisa, está a falta de fundamentação histórica para a data 607 AC como ano em que Jerusalém foi desolada, a partir de onde teriam começado os 70 anos de cativeiro de Israel na Babilônia. Essa data é crucial para a cronologia que levaria ao ano de 1914, extremamente importante na interpretação bíblica das “testemunhas de Jeová”. Assim, se a data 607 AC estiver errada, a cronologia a que serve de base estará errada. E se a cronologia estiver errada, a teologia também estará errada.

Franz conta que levou o problema da falta de fundamento para tal data básica a seus pares, durante uma reunião do Corpo Governante. Pesquisa realizada por ele e seu secretário em todas as bibliotecas da área de Nova York, e outras informações que lhe chegaram de um ancião TJ na Suécia (Carl O. Jonsson, que, independentemente de suas próprias investigações preparara um estudo detalhado sobre o assunto), convenceram-no de que tal data realmente era infundada. Posteriormente, Jonsson também abandonou a seita, tendo escrito uma obra erudita discutindo a falsa cronologia bíblica das TJ, intitulada The Gentile Times Reconsidered [Reavaliação dos Tempos dos Gentios].
Ele lembra como o assunto causou grande celeuma entre seus companheiros dirigentes das “testemunhas de Jeová”. Finalmente, puseram em votação as alternativas de reconhecer e corrigir o erro, segundo os dados históricos admitidos pelo consenso de historiadores de gabarito (a data correta seria 586 AC), ou manter a tradição interpretativa. Pelo levantar da mão daqueles chefes religiosos, decidiu-se que Jerusalém teria sido desolada quase 20 anos antes da data real para o acontecimento, ou seja, optaram pela tradição!

Perguntei a Franz se o voto majoritário de seus antigos pares tinha sido motivado por estudos profundos empreendidos por eles que contrariavam o consenso de historiadores e arqueólogos a respeito da data correta, ou por alguma nova pesquisa arqueológica em que eles próprios teriam se engajado ou sido informados a respeito. Ele apenas sorriu, como resposta.

Entre os fatos marcantes de sua experiência à frente da organização jeovaísta, Franz lembra a grande perseguição a que as “testemunhas” foram submetidas no Maláui, pequeno país do sudeste africano, devido à recusa deles em adquirirem um cartão do partido único do governo ditatorial daquele país. A literatura das “testemunhas” não se cansava de ressaltar a grande injustiça e o sofrimento desses religiosos, sujeitos a todo tipo de preconceito, estupros e maus tratos. Muitos tiveram que abandonar o país, sob condições penosas para nações vizinhas e os textos bíblicos que falam de perseguição aos fiéis seguidores de Cristo nunca deixavam de ser citados nas revistas A Sentinela e Despertai! ao se referirem ao caso.

Qualquer ato de perseguição contra pessoas por convicções políticas ou religiosas é decerto condenável e lamentável. O que o público nunca soube, porém, é que enquanto se requeria estrita adesão às ordens da Sociedade Torre de Vigia das “testemunhas de Jeová” do Maláui, para não rebaixarem as normas aceitando a ordem governamental (o que contrariaria sua posição de absoluta neutralidade ante os governos humanos), no México as “testemunhas” eram instruídas a obterem um documento de isenção de serviço militar mediante um ato ilegal: o suborno!

O escritório regional das “testemunhas” no México, em busca de orientação sobre como agir no caso, escrevera à Torre de Vigia, em Brooklyn, Nova York, explicando que a prática de obter os documentos de isenção do serviço militar, por propinas, era comum no país, mas reconhecidamente aética. Explicava que as “testemunhas” de sexo masculino praticavam o mesmo que muitos outros de seus concidadãos mexicanos—pagavam “la mordida” aos chefes militares para não terem problemas, não serem presos, etc.

A orientação da sede mundial das “testemunhas” foi simplesmente incrível: sendo que o dinheiro pago a esses militares corruptos não seria encaminhado para beneficiar a máquina de guerra do país, e sendo que o pagamento de propinas já era algo enraizado na cultura local, que os jovens “testemunhas” pagassem a tal taxa para obter o seu documento de isenção do serviço militar, ilegalmente ou não, e se livrassem do problema!

Dois pesos, duas medidas! Franz documenta, em seu livro, tudo isso, em detalhes, com fotocópias da correspondência trocada entre o escritório do México e a sede mundial da seita.

Franz não foi logo “excomungado” ao desligar-se de seu posto na organização. Mudou-se para Gadsden, Alabama, onde foi morar com um amigo que ainda pertencia à religião. Pouco depois, este também apresentou objeções a aspectos doutrinários da seita e foi excluído como membro em sua congregação local que Franz também freqüentava. Na época, ficou decidido pelo Corpo Governante, que uma antiga regra de ostracismo aos afastados da religião seria restabelecida: a de proibir qualquer membro ativo a sequer saudar à distância um “apóstata”, ainda que desligado a seu próprio pedido.

Ao ser visto por uma pessoa do Salão do Reino em Gadsden, comendo num restaurante em companhia de seu amigo excluído da religião, a tecnicalidade legal foi encontrada para também excluí-lo, e à esposa, da comunhão das “testemunhas de Jeová”. No artigo do Time acima referido, uma irônica legenda sob a foto de Franz sintetiza o absurdo de tal medida. Diz a revista: “Losing heaven over one restaurant meal” [perdendo o céu em função de uma refeição num restaurante).
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Fonte: http://www.geocities.com/irmaobrasil/entrevistaray.htm

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